Sexta-feira no Blog do Alex Fraga é dia de texto da escritora e poeta de Campo Grande (MS), Sylvia Cesco intitulado Pequeno Conto de um Natal Brasileiro.
Pequeno Conto de Um Natal Brasileiro
Sylvia Cesco
Na Fazenda Iaciretã, aos pés da Serra do Amolar, a noite foi chegando. Os três vaqueiros, Josias, João e Josualdo, decidiram não participar do dedo de prosa no galpão, acompanhado de uma chorosa viola. Seu dia havia sido por demais trabalhoso, campeando boi pra cima e pra baixo, levando um rebanho de guzerás, gado bom de carne e leite, para uma fazenda vizinha. Em outras noites, por certo que estariam aboletados sobre suados baixeiros, dando boas gargalhadas dos causos contados pela companheirada. Mas não naquela. Os três amigos, mesmo sem qualquer comentário entre si,- que gente do Pantanal é feita de palavras pra dentro e não pra fora, - haviam tido um igual pressentimento de que algo diferente estava para acontecer. Pois não houvera de ser assim? Eram caboclos pantaneiros, donos de saberes empíricos, herdados pelo costume de observar e interpretar os fenômenos da natureza, que desafiavam o saber dos estudiosos da ciência. No entanto, naquela noite de final de dezembro, nem Josias, nem João, nem Josualdo conseguiam entender que céu era aquele que se explodia diante de seus olhares estupefatos: uma imensa estrela-candieira guiava um luminoso rebanho de outras menores, formando um mágico trieiro que era acompanhado, aqui na terra, por seis atentos pares de olhos- caboclos. Seus donos repararam que esse caminho iluminado seguia pro lado do rancho de José, casado com Maria , que estava prestes a dar à luz o seu primeiro e amado filho. Já haviam posto sentido que, ultimamente, José andava apreensivo. Zé não era vaqueiro nem peão. Vivia de construir e consertar mangueiros, num estafante serviço de serrar, pregar, martelar grossas aroeiras para os fazendeiros da região. Morava junto com a mulher num ranchinho reflorescido de borboletas manhosas e sabiás sonolentos, escondido dentro de meio hectare de boa terra, ganhado de seu Jacinto ( que Deus o tenha), quando para ele trabalhou como culateiro de comitiva. Depois que o patrão morreu, Zé tratou de enraizar seus pés naquele rancho, não sem antes se casar com Maria. Homem jeitoso e trabalhador, logo estava sendo conhecido como o melhor cerqueiro da região e foi estendendo esse dom para outros serviços afins. Josualdo foi o primeiro a quebrar o silêncio entre os três: - “O que vocês acham?”
- “Acho que o Menino do Zé mais Maria nasceu”, respondeu Josias.
- “Pois eu não acho. Tenho certeza”, disse João convicto.
- “Bendito seja seu Filho”, exclamou Josualdo, tirando o chapéu em sinal de respeito, gesto que foi acompanhado por João e Josias em uníssona exclamação:-“Bendito seja”. Pensativos, foram se recolhendo para o necessário repouso, que logo mais, de madrugadinha, dona Santa já os estaria aguardando para o quebra-torto.
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