Texto/Poesia - Madrugada, por Raquel Naveira
- Alex Fraga

- 20 de fev.
- 3 min de leitura

Quinta-feira no Blog do Alex Fraga é dia de texto e poesia com a escritora e poeta de Campo Grande (MS), Raquel Naveira, com "Madrugada".
MADRUGADA
Raquel Naveira
A madrugada é o símbolo da luz e do despertar. Após a longa noite, às vezes de angústias e de medos, a aurora surge abrindo as portas de um novo dia. Novo, sem rugas, sem máculas, pronto para começarmos a escrever um destino de possibilidades e de promessas. É o eterno recomeço, a chance, a oportunidade de mudança.
Na madrugada as colheitas desabrocham. É a esperança da vida que caminha seguindo os raios de sol, depois de mais uma vitória sobre o mundo das trevas e dos espíritos perversos.
Jó, questionando o homem soberbo, disse: “_Acaso és tudo que o que depois do teu nascimento deste lei à estrela d’alva e o que mostraste à madrugada o seu lugar? E tomaste a terra pelas suas extremidades para fazê-la estremecer e sacudir dela os ímpios?”
Quem ora de madrugada buscando comunhão com Deus, abrindo o coração com sinceridade, vê suas preces atendidas de forma misteriosa.
A madrugada de dedos cor-de-rosa e tiritante sempre foi tema dos poetas. Nela o poeta sente-se testemunha dos acontecimentos primeiros.
Vinícius de Moraes (1913-1980), poeta, diplomata, crítico de cinema, era dono de uma lírica carregada de sensualismo como neste “O Sacrifício da Aurora”, do qual transcrevo uma estrofe:
Um dia a Aurora chegou-se
Ao meu quarto de marfim
E com seu riso doce
Deitou-se junto de mim,
Beijei-lhe a boca orvalhada
E a carne tímida e exangue,
A carne não tinha sangue,
A boca sabia a nada.
Também Cecília Meireles (19011964), poeta, professora e jornalista carioca, fez inúmeros poemas dedicados à madrugada. Em “Madrugada”, lembra o canto dos galos:
O canto dos galos rodeia a madrugada
De altas torres de música chorosa.
Em “Madrugada no Campo”, pinta um retrato bucólico:
Com que doçura esta brisa penteia
A verde seda fina do arrozal-
Nem cílios, nem pluma, nem lume de lânguida
Lua, em o suspiro do cristal.
E em “Madrugada na Aldeia”, cria um clima de neve e silêncio:
Madrugada na aldeia nevosa,
Com as glicínias escorrendo orvalho,
Os figos prateados de orvalho,
As últimas uvas miraculosas.
Pensando na noite inclinada para o ocidente em sono e no sol que arranca da terra as estrelas, escrevi:
As estrelas se recolheram
Como moluscos de prata em caracóis,
A lua tímida
Cobriu a face com uma nuvem
E despejou lágrimas de orvalho
Sobre as superfícies lisas.
O sol veio vindo de mansinho,
Estendendo os braços de seus raios,
Disco de fogo
Por entre as carnes da montanha,
Como um filho nascendo.
É madrugada
E em algum lugar
Um galo brusco e vermelho
Anuncia o dia.
É madrugada,
O amante espia o corpo da amada,
Abre uma fresta de janela
E salta para o dia.
É madrugada,
O vampiro se esconde na capa,
Procura um buraco de pedra
E foge do dia.
É madrugada,
Os bois acordam nos pastos,
Contemplam o sol com olhos turvos
E ruminam o dia.
É madrugada,
Os homens saem de suas redes,
Fervem o mate
E enfrentam o dia.
É madrugada,
A vida recomeça
Como virgem purificada
Nas águas do dia.
É madrugada,
A natureza está toda molhada,
Verde e renovada,
Na esperança do dia.
É madrugada,
Que se coloquem lenços sobre as feridas,
Que se lavem as paredes ressequidas,
Que se cantem as alegrias esquecidas
Nesse novo dia.





❤️❤️❤️❤️❤️❤️
Raquel é simplesmente maravilhosa!
Solange Brito -Campo Grande MS
Raquel Naveira sem dúvida é orgulho do Mato Grosso do Sul.
Gisele Bonfim ,- Campo Grande MS
Sempre fantástica,!
Cristina Moreira
São Paulo SP