
Sábado no Blog do Alex Fraga é dia de texto com o jornalista, poeta e escritor de Brasília (DF), Inorbel Maranhão Viegas, com "Intrépido".
Intrépido*
Era sempre no fim das manhãs, na volta pra casa.
Ladeira da Belira. Rua do passeio. Praça da Saudade. Beco do Gavião. E finalmente meus pés pisavam o chão da Madre D’eus. Minha casa estava no meio do caminho, no 93 da Avenida Rui Barbosa, antes de chegar ao Morro do Querosene. Viagem memorial entre a minha primeira escola e o lugar onde nasci. Era eu, menino, fazendo os primeiros desbravamentos de um caminho, que eu nem sabia, sem fim.
Nas manhãs geladas de São Leopoldo, o frio era tanto que doía nos ossos. Era um tempo em que caminhar de casa à faculdade era o natural. O possível. Do fazer e do aprender. E isso foi bem antes do Guaíba encher. Me dou conta agora, eu era um desbravador. Saído do calor do Nordeste, assentado no frio inimaginável do Sul. Intrépido.
Antes da pandemia tomar o mundo, subi com meu amor a Cordilheira dos Andes, no ponto em que ela atravessa o Chile. Corremos morro acima o quanto deu. Não deu muito, porque correr pela cordilheira, seja ela qual for, é para poucos e de pulmões bons. Então andamos mais que corremos. E depois de alcançar o alto, descemos. A coragem dos principiantes era o combustível. Me vi crescido, dono do meu nariz. E, quem sabe, do mundo.
No centro de Santiago do Chile há uma rua onde todas as lojas vendem coisas de costura. Máquinas, panos, agulhas e linhas. Quando caminhei por lá só lembrava de uma coisa: minha mãe ia adorar isso aqui! Era a poesia me lembrando. Era a minha existência justificada nesse plano.
Inorbel Maranhão Viegas
Brasília 18/05/24
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