Reflexão - Diário de uma Idosa 269, por Joana Prado Medeiros
- Alex Fraga
- há 8 horas
- 3 min de leitura

Quarta-feira no Blog do Alex Fraga é dia de texto de reflexão com a professora universitária, historiadora, poeta e escritora de Dourados (MS), Joana Prado Medeiros, com seu Diário de uma Idosa 269.
DA SÉRIE AMIZADE - 02
- Eu tinha doze anos quando minha mãe permitiu que eu depilasse as pernas...Foi uma festa lá no tanque de lavar roupas da casa da minha amiga, tínhamos a mesma idade, foi uma verdadeira cerimônia. O carnaval foi uma beleza, fomos fantasiadas de indígenas, o pai da minha amiga nos levou ao matinê, foi o meu primeiro carnaval. O pai dela era jornalista a casa cheirava tinta e jornal eu aprendi amar os jornais e a leitura. Crescemos no mesmo quarteirão à noite brincávamos jogando bola. Na juventude ouvíamos "It's a Heartache", eu tinha um radinho pequenino de capa verde oliva era o nosso xodó. Depois tinha um toca disco portátil azul que era o supra sumo da alegria, minha amiga amava músicas francesas e eu as italianas, eu tomei emprestado dela um disco de músicas românticas francesas que nunca devolvi e quando ela foi morar um tempo em São Paulo eu me esguelava ouvindo "Elise et moi" e chorava. Guardo até hoje uma carta que ela me enviou de Sampa. Por essa época em uma bebedeira marcamos um encontro (para o futuro) para nos vermos 10 anos depois, data, mês e ano, às 15 horas em frente a praça principal de nossa cidade, mantivemos o compromisso cuidadosamente anotado e ao longo dos anos comentávamos sobre nosso terrível encontro no futuro, "assucede" que eu fui morar fora, ela também, depois retornamos e daí passado os dez anos "no dia do nosso famoso encontro" a gente se falou por telefone com muitas risadas e pronto. Durante os primeiros anos da faculdade éramos inseparáveis, estudávamos história (hoje ela é advogada) o meu apelido era Zé Carioca e ela era o Nestor...Morena de sol, sempre bronzeada de cabelos lisos, seios fartos e linda. Eu franzina só tinha coxas e cabelos. Ela dizia -Joana se tacarem fogo na Igreja Matriz vou imediatamente saber que foi você. Nossa amizade sem parâmetros e cobranças seguiu e juntos choramos o luto, ela perdeu seu maninho, um jovem extraordinário, jornalista de humor ácido e inteligentíssimo eu o imitava caminhando pelas ruas lendo jornal. Quis o destino que eu chegasse de Cuiabá justo neste triste dia...E não passou nem um ano deste acontecer, eu também perco meu único maninho...Ele se foi tão jovem aos vinte anos. Eu e minha amiga de infância, de juventude de sonhos e guaviras, somos irmãs na saudades. Fui sua madrinha de casamento...Ficamos meses sem nos ver e quando nos falamos é como se fosse ontem, nada trincou e a tônica é a mesma da vida inteira, sem delongas, sem filtro, sem cerimônias, somos amigas e ponto. Ela acompanhou as minhas trezentas peripécias amorosas, minhas pneumonias, asmas e acertos. Ela é absolutamente chique, sofisticada, bom gosto, eu de pés no chão, descabelada e desconectada. Ela chorou comigo agora no meu último deserto, eu não chorei com ela quando esteve lutando por sua saúde, felizmente ( egoísta eu) eu não soube, (pois iria ficar mais deprimida do que já estava) só soube agora. E ela é vitoriosa. Ela é uma Portuguesinha linda e eu amo Fados, ela já é avó, agora tem os cabelos encaracolados e grisalhos, riso grande e arranca de mim os meus mais profundos segredos, me puxa as orelhas, me diz tome juízo e nossa amizade tem cincoenta e seis anos, repete! sim 56 anos. Zildinha, Zilda Almeida minha amada amiga que tem os pés no chão um espírito em constante oração e uma alma que abraça o mundo com fé inabalável - Eu te amo, eternamente eu te amo.
( Joana Prado Medeiros - 13/05/2025 - Direitos Autorais Lei 9.610/98).