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Reflexão - Diário de uma Idosa 178, por Joana Prado Medeiros

Foto do escritor: Alex FragaAlex Fraga

Quarta-feira no Blog do Alex Fraga é dia de poesia com a professora universitária, historiadora, poeta e escritora de Campo Grande (MS), Joana Prado Medeiros, com seu Diário de uma Idosa 178.


DIÁRIO DE UMA IDOSA 178

O GRITO DO PORCO, SANGUE E CANTORIA


Era dia de matança na fazenda!!! No dia anterior o galpão era lavado, os jiraus lavados e suas tábuas (re)pregadas, as latas limpas e colocadas ao sol para secar, os dois tachos também limpos e ao sol. Tijolos, arrumados esperando a lenha que empilhadas aguardavam o fogaréu. O dito cujo do porco já estava há dias separado em outro chiqueiro, na solidária, ele era cuidado mal sabia o pobrezinho que ia entrar na faca. As facas afiadas, aventais e chapéus e panos de prato tudo pronto. Logo ao amanhecer o fogo já aceso, latas e latas de água fervendo. Eu me enrolava na cama e ficava tinindo de desespero e logo escutava o grito agudo do porquinho que de porquinho não tinha nada, pois dava até cinco ou seis latas de banha. Aquilo me cortava o coração, o grito dele fazia um oco no meu peito, depois, o silêncio e quando eu sentia o cheiro de couro queimado já sabia que estavam despelando o bichinho. Corria e ficava em volta vendo a água quente sendo despejada e a faca deslizando. Aí era aquele sangueiro, o animal era aberto ao meio e começava a cortança, os bofes, visseras retiradas, as vezes eu ia com minha avó ao córrego ( Corgo) e ficava olhando ela lavar as tripas, eram usadas para fazer linguiça. Pedaços de carnes fritas eram guardadas nas latas de banha. Lá pela tarde os toucinhos fritos, torresmo e pururuca eram comidos com mandioca cozida e a coisa ia virando uma festança. Meu pai gostava de comer chouriço tomando Cinzano ( qdo cresci eu acompanhava) ao entardecer todos cansados, sentados em volta do fogo tomando pinga Tatuzinho e contando causos de assombração, lá pelas tantas um tio tocava sanfona e o outro o violão. As mulheres continuava o trabalho no fabrico de linguiças. Minha avó Joana ia arrumando sacas acho era de açúcar era feita de fios de náilon entrelaçados brilhantes ia guardando em cada saca uma rodilha de linguiça um pouco de carne, era vários sacos, separados e nomeados: Este era da dona Filipa do seu João, este é do Paraíba, este é da Mariazinha e assim por diante. No outro dia meu primo ia a cavalo levar o presentinho para cada vizinho. Os cachorros faziam a festa o Tocha era o líder o Franzino e o Leão na rabeira. Nunca entendi porque meus dois gatinhos sumiam, só voltavam no outro dia. Acho que é porque eles eram gatosanjinhos. A criançada fazendo campeonato de caça aos vagalumes eles eram capturados e guardados dentro de um litro. A noite era colorida e quente, cheirava carne. Eu ficava muito encabulada com tudo aquilo, para dormir toda a molecada fazia fila e lavava os pés na mesma bacia e água e depois cada um tomava uma caneca de chá de capim cidreira para acalmar e não ter sonhos ruins. E vinha a parte que eu mais gostava que era quando lá de longe uma tia gritava toca aquela moda que eu gosto. Era a hora do sonho do meu sonho, deitava no batedor de lavar roupas e ouvia meu tio/padrinho cantando - "Abre a porta ou a janela. Venha ver quem é que eu sou. Sou aquele desprezado, que você me desprezou. Eu já fiz um juramento, de nunca mais ter amor." Eu suspirava de dó do desprezado, eu pensava o delegado da cidade devia prender quem despreza, cresci, minhas mãos hábeis cortou ainda muitos toucinhos só não aprendi a desprezar quem tanto me desprezou.


( Joana Prado Medeiros - 08/08/2023 - )

 
 
 

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