Sexta-feira no Blog do Alex Fraga é dia de poesia da escritora e poeta sul-mato-grossense Sylvia Cesco com seu poema "Transformação".
Transformação
Sylvia Cesco
Lá fora, um pássaro soluça orvalhos
que já não lhe matam a sede
e por isso tem o bico seco, a garganta exaurida
e as asas murchas.
Pobre pássaro aguardando a chuva
para voltar a cantar no galho de um ipê!
Olho-o pela janela em silêncio:
-sua dor é minha dor
e ambos sabemos que ninguém as vê.
Escancaro as portas da minha velha casa:
-Entra, amigo-irmão alado,
te acomoda no alto da antiga prateleira
onde guardo meus Neruda ,Vinícius, Lorca,
Pessoa e Manoel.
Descansa tua tristeza enquanto vou ali e volto já.
Pressinto que tu vais gostar
das minhas águas de beber
e de enxaguar.
E volto com as mãos em concha
cheias do precioso líquido da vida
que a ave bebe com sofreguidão.
Finda sua visita-pouso, aponto-lhe
portas e janelas abertas a indicar
o caminho da sua liberdade.
Para o meu humano espanto
( mas não dos poetas, pois estes o entendem)
o pássaro volta a gorjear suas canções
em meio aos versos, poemas e poesias.
Voa pra longe ao findar o dia
e retorna no outro e no outro e outro mais.
Estamos ambos felizes, ambos em paz.
Minha velha casa-ninho enfim se transformou
numa sementeira de acordes musicais.
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