
Sábado no Blog do Alex Fraga é dia de poesia com o empresário e poeta de Dourados (MS), Fabiano Pereira, com "Infância em preto e branco"
INFÂNCIA EM PRETO E BRANCO
Dizem por estas bandas
Que, lá muito antigamente,
Nas currutelas e nessas andanças,
A gurizada vivia contente.
As ruas de terra sujavam
As roupas lavadas à mão.
Na água gelada que ardia,
O pai trabalhava e sofria.
E no fim do dia, ao voltar,
Na Monark a pedalar,
Via, na TV preto e branco,
O apresentador a falar,
Se o pouco que ia sobrando
Dava pro mês completar.
Ah, o passado...
Sem ar-condicionado,
Os raspa-pés na entrada da casa.
“Botina suja não entra, não!”
Nascia ali o pé-rapado,
Enquanto o vizinho abastado
De manhã, com seu velho ritual:
Entrava no carro, puxava o afogador,
Pisava três vezes no acelerador.
Com sorte, o carro pegava,
Deixava o motor esquentando,
O álcool vaporizando,
Carro pronto pra batalha.
Mas, se o carro não pegasse
Ou se o motor afogasse,
Já se sabia no que ia dar:
Empurrava com toda a força do mundo,
Ladeira abaixo, o carro pro tranco.
Torcendo para ele pegar,
Pisando fundo, sem descanso,
Ninguém podia vacilar,
Já era hora de trabalhar.
“Guri, na escola não pode faltar!”
E lá também ia o pai.
A mãe preparava o almoço,
A tarde, na rua, a turma brincava.
Era um grande alvoroço,
Tudo era lá fora: bolita, bets, pé na lata...
O vôlei que trancava a rua.
E se quisesse ligar para o amigo,
Não tinha problema, não.
Bastava correr até a esquina,
Onde o celular era o orelhão.
Mas, olhando pra trás agora,
A saudade que vem de outrora,
É o olhar para aquela infância,
Correndo livre em abundância.
Fabiano Pereira
Bons tempos