Por Erika Espíndola ***
Júlio César Garcia de Queiroz, ou simplesmente Júlio Queiroz, respira música. O multiinstrumentista e produtor de 34 anos nasceu em Dourados, no interior do estado de Mato Grosso do Sul e começou a tocar na noite aos 14 anos. De lá pra cá foram inúmeros projetos com bandas em Campo Grande e também no Guarujá- SP, cidade onde morou por algum tempo.
Sensível e perfeccionista, Júlio assina trabalhos de produção musical de diversos artistas de Campo Grande, dentre eles DoValle, Geraldo Ribeiro, Guilé, Franke, Beget de Lucena e Erika Espíndola, além de trilhas sonoras de filmes e séries produzidas em sua terra natal.
Morando em Portugal com a família há quase 7 meses, o artista irá lançar seu primeiro disco solo, intitulado “1/4”, nessa sexta-feira, 17 de abril de 2020. Tive a oportunidade de escutar o novo álbum em primeira mão e bater um papo virtual com esse rapaz talentoso. Na entrevista, Júlio fala sobre sua adaptação à nova vida na Europa, ao confinamento devido à pandemia de covid-19 e sobre como foi criar um disco em meio a tantas mudanças.
1. Como está sendo a adaptação com falar português de Portugal?
R - Tranquilo e rápido. No começo foi difícil. Ficava nervoso toda vez que precisava falar com alguém por telefone ou pessoalmente. Mas foi muito rápido. Uma semana depois eu já estava tranquilo. O português de Portugal é uma língua clássica. Do hippie ao advogado, eles falam bem parecidos. Enquanto no Brasil é uma doidera (no bom sentido). Várias formas de dizer a mesma coisa, cada tribo com suas gírias e seu próprio jeito de concordar as palavras.
2. As pessoas falam qual outro idioma com mais frequência aí além do português? Como isso interfere no seu processo criativo?
R - O inglês. Praticamente todo mundo fala inglês por aqui. Já teve vez de eu ir em um café e a atendente nem falava português, só inglês. O que eu acho lindo. Eu não falo inglês. É uma vontade muito antiga que eu tenho e que faltava o impulso. Já tem uma música em inglês no meu disco que compus no google tradutor. E também já gravei versões de músicas internacionais já com o intuito de praticar o idioma. Interfere pois meu desejo com artista é que minha arte seja compreendida pelo maior número de pessoas possível.
3. Suas músicas parecem bem autobiográficas, né? Pergunto por causa da música “Vamos morar juntos”, parece que você escreveu para a Paula, estou certa? Fale mais sobre essa faixa.
R - Ãs vezes sim, às vezes é só um ponto de partida. As vezes brota um sentimento mas eu acabo saindo do personagem e criando situações que eu não estou vivendo apenas para alimentar a história contada. No caso da Vamos Morar Juntos, eu já moro com minha parceira desde 2003. E na música canto como se estivesse convidando para morar comigo. Não é o que estou vivendo no momento, mas me recordo dos sentimentos vividos para ir compondo a obra.
4. Comente a faixa “Mandioca”, haha! Eu amei!
R - É uma instrumental que tenho desde o Brasil. O nome vem de uma característica da música regional de MS, que é o tempo ¾. Por isso pensei na Mandioca, que é uma palavra muito nossa. É tão nossa que em outros estados é chamada por outro nome (macaxeira por exemplo).
5. A faixa “Meanwhile” é composta em inglês. Você em algum momento teve medo / vergonha de gravar? Se sim, como fez para superar esses sentimentos e colocar essa canção no mundo?
R - Medo e vergonha não porque fiz sem compromisso nenhum. Mas gostei tanto do resultado que fiquei seguro. Mas antes enviei a música para dois amigos, fiz algumas correções e no final gostei muito. Não escondo que não sei falar o idioma e talvez isso tire a obrigação de ter uma pronuncia perfeita e também cresci ouvindo o Caetano Veloso cantando inglês com sotaque de baiano. Na arte tudo é permitido.
6. Eu sei que a faixa “E daí” já teve letra e a letra era muito boa. O que te fez decidir por deixá-la apenas no instrumental?
R - O fato de eu nunca ter gostado. É uma canção que tenho na manga há muito tempo. Inclusive ela quase entrou no repertório do PúrPura certa vez. Mas confesso que nunca achei que a letra fosse o que a música pedia. Já fiz várias letrar para ela mas nunca fiquei feliz com o resultado. E como gosto muito de discos que tem músicas instrumentais no meio, como que ajudando a contar uma história, resolvi deixa-la assim. Mas deixei o E Daí? Pois foi com essa frase que ela veio ao mundo. Seria injusto tira-la. Ficou sem sentido? Sim, mas e daí? Gosto dessas piadas que a música permite fazer. Por ser instrumental pode ter perdido força como canção, mas da forças ao álbum. É o que eu acredito.
7. Você tem planos / expectativas para esse novo trabalho?
R - Eu tinha planos de sair para toca-lo no verão Europeu, que é quando o país ferve de festivais e atrações em todos os cantos. Agora já não sei mais se será possível. Pois a Europa inteira esta fechada e em quarentena. O que é um pouco frustrante, pois um artista como eu vive de shows. Mas o fato de eu soltar esse disco no mundo, e ver pessoas ouvindo já me preenche totalmente o coração. Vou jogar essa garrafa no mar e ver onde ela vai parar
8. Deixe uma mensagem pra galera do Brasil e do mundo a respeito da nova fase que estamos sendo forçados a viver, que é a pandemia de Covid-19.
R - A mensagem é: se cuidem e cuidem dos seus. Sem pânico mas atento.
É uma oportunidade única que a humanidade esta tendo para rever muitas coisas. Mesmo que a duras penas. Não sei como vai ser o mundo depois disso. Há um risco de isso passar e não mudar nada, pois quem tem o domínio do dinheiro vai fazer de tudo para que continue como esta e porque o ser humano é muito teimoso e orgulhoso. Mas também acredito que todos que tem um mínimo de sensibilidade e sabedoria vão tirar muita coisa boa da situação e evoluir.
9. É isso, Júlio, muito obrigada pelo seu tempo e pelo seu álbum, que ficou muito lindo! Ansiosa pelo próximo trabalho! (Aí você agradece também)
R - Eu quem agradeço a atenção e espero que tenha feito um disco que toque as pessoas.
*** Erika Espíndola é cantora e jornalista
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