Crônica - " Ela era um Blues do Norte", por Narinha Lee
- Alex Fraga
- 19 de set. de 2021
- 2 min de leitura
Domingo, agora no Blog do Alex Fraga, crônica da poeta e escritora campo-grandense, Narinha Lee, com sua crônica " Ela era um Blues do Norte" - com base em faatos reais acontecidos quando ela morava em Québec.

Ela era um Blues do Norte
Era primavera em Québec.
Eu a via todos os dias pela manhã. Abria a pequena cortina da janela da cozinha, e lá estava ela.
Branca, magra e desfolhada.
Às vezes parecia santa, mas nem tanto... Mesmo sem ouvir era capaz de escutar o seu pranto.
Sob a laje do subsolo um cantinho...
Num minúsculo banquinho uma silhueta parecia pesar sobre ele. Era ela!
Não sei de onde veio, mas lá estava dias após dias magra, branca e desfolhada.
Intrigava-me!
Eu na minha constante impavidez e falta de imobilidade não entendia aquela silhueta estática olhando para o nada como se visse tudo.
Minha alma sempre desnuda para o mundo, mirava aquela cena intrigante.
Apesar do incômodo eu precisava vê-la todos os dias.
Era algo inusitado para o meu cotidiano acelerado.
Num dia em que o Sol estava recluso, abri a pequena cortina e ela não estava lá...
Uma frustração tomou conta de mim. Ela tinha que estar lá...
Eu precisava daquela visão.
Já fazia parte da minha loucura humana.
Horas depois ela surgiu e lá ficou olhando o nada, toda desfolhada...
Sorri! A imagem em ribalta satisfazia minha curiosa e louca visão do cenário atípico.
Por vezes pensei em falar-lhe... Não ousei quebrar aquele silêncio quase mortal para mim.
Penso que ausentar-se e quedar-se na imobilidade seriam formas encontradas para driblar as adversidades. Assim, no vácuo da sua existência flutuaria simplesmente.
- Seria essa uma das armas dos mais fracos?
Ela se foi numa gelada manhã.
O vento a levou para o norte do norte.
Não me deixou nenhuma lição, mas marcou minha visão.
Nunca a esqueci.
Acho que ela era um Blues do Norte.
Narinha Lee
Uma composição linda, encharcada de sentimentos!
É de se esperar vindo dessa autora incrível!
Que bela crônica! Leitura agradável como chá de flor!