Conto - Um contra todos. Todos contra um, por João Francisco Santos da Silva
- Alex Fraga
- 8 de mar.
- 3 min de leitura

Sábado no Blog do Alex Fraga é dia de conto com o médico clínico geral, acupunturista e escritor de Campo Grande (MS), João Francisco Santos da Silva, com "Um contra todos. Todos contra um".
UM CONTRA TODOS. TODOS CONTRA UM
Recrutado de última hora, o mestre de cerimônias teve pouquíssimo tempo para elaborar uma fala apropriada a situação. Se ao menos conhecesse o homenageado, sua tarefa seria mais fácil. Improvisou um pequeno discurso baseado no bilhete escrito, também de última hora, pelo próprio interessado. Para isso associou uma fala genérica que costumava empregar nessas ocasiões, com uma síntese de sua livre interpretação do bilhete deixado. E proferiu o seguinte discurso:
“Chega um dia em que todos nós nos cansamos das inúmeras batalhas e obstáculos cotidianos. E muitas vezes precisamos mudar de ares, de lugares e mesmo de afetos. O nosso amigo sentiu que necessitava deixar a Todos e foi experimentar uma nova situação. Mas, antes de partir ele escreveu uma mensagem de ânimo e otimismo para todos vocês: “Vivam. Vivam plenamente. Vocês me ajudaram a ser quem eu tenho sido. E sobretudo, não chorem. Façam como eu que agora estou sorrindo. Eu sei que sempre estarei plantado nas suas mais profundas lembranças”.
Ao término do curto discurso, o silêncio foi absoluto. Momento de reflexão existencial. Todos agora experimentavam um mesmo arrependimento. Arrependiam-se do queriam ter-lhe dito e não conseguiram. Sensação de nó na garganta. Frases aprisionadas e nunca pronunciadas em discussões sempre bruscamente interrompidas por Ele. Agora, Todos se ressentiam de que o gesto final tenha sido Dele. É fácil ser quem diz o último foda-se para Todos. E como sempre, Ele não iria ouvir o que Todos queriam lhe dizer. Calou a boca de Todos. Impediu qualquer argumentação contrária. Conseguiu deixar para Todos um permanente incômodo de raiva não extravasada. Sentimento plantado e que recidivará a cada nova recordação sua.
Detestado por Todos, Ele não podia morrer. Precisava permanecer vivo. Incomodando, blasfemando e irritando a Todos. Tipos assim deviam ser os últimos a saírem de cena. Mas, de propósito, Ele antecipou sua saída. Derradeira agressão destinada a Todos. Vingativo, deixou para Todos o seu legado. Não foi seletivo, tampouco escolheu pessoas específicas. Nada mais justo, já que a razão dos tantos problemas ocorridos em sua vida, Ele considerava ser culpa de Todos os outros.
O bilhete original por ele deixado foi ainda mais sucinto que o adaptado pelo celebrante:
“Todos que nunca me compreenderam agora sabem do que sou capaz de fazer. O mundo é muito agressivo e sempre procurei reagir a ele. Decidi dar um basta. Cansei de lutar sem ser compreendido. Vocês Todos são os responsáveis por eu ter chegado até
aqui. Todos vocês se merecem uns aos outros. Agora eu rio de Todos vocês. Não precisam chorar por mim”.
Nota do autor:
O dia 10 de setembro é oficialmente, o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio.
Se você está pensando em suicídio, procure ajuda!
Existem muitos recursos disponíveis para lhe ajudar a superar esse momento difícil. Se conhecer alguém que precise de ajuda e não souber o que falar ou que fazer, ofereça um abraço. Escuta ativa, presença e gestos de acolhimento podem fazer a diferença em situações críticas.
Além disso, você pode ligar para o CVV pelo número 188 ou também, acessar o site oficial para conversar com um voluntário. No mais, tente procurar também um profissional de saúde mental para um tratamento a longo prazo.
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Adoro teus contos.
Luciana Teixeira
Campo Grande MS
Parabéns. Excelente texto.
Romilda Pereira
Santos SP