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Artigo - “Indígenas respiram veneno, passam sede, enquanto Governo renuncia Bilhões”, por Paulo Esselin

  • Foto do escritor: Alex Fraga
    Alex Fraga
  • há 14 horas
  • 7 min de leitura

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Por Paulo M. Esselin*** - - - - -


“Porque gado a gente marca Tange,

ferra, engorda e mata,

mas com gente é diferente”

Geraldo Vandré


Denúncias revelam pulverização ilegal de agrotóxicos sobre aldeias Guarani-Kaiowá, sequestro de adolescente, fake News rurais e repressão policial — enquanto direitos básicos como água potável continuam sendo negados pelo Estado.



Desde o século XVI, na Capitania de São Paulo, desenvolveu-se uma economia de subsistência, apoiada em regime de escravidão doméstica; todas as atividades produtivas, o cultivo, a colheita, a produção de objetos de cerâmica, a indústria de tecelagem, a derrubada, a queima das matas e as construções eram realizadas com o trabalho indígena.

À medida que os nativos iam se interiorizando, correndo da escravidão e dos maus tratos, os colonizadores foram indo ao seu encalço e, em busca de mão- de- obra, chegaram ao Itatim, atual Mato Grosso do Sul. Aqui, os índios eram capturados e levados para São Paulo, na condição de escravos.

Na longa marcha do Itatim para São Paulo, era comum desfazer-se dos doentes, dos velhos, aleijados e crianças, porque eles atrasavam o deslocamento, diminuindo o ritmo da caminhada. Os bandeirantes “comportavam – se com tamanha crueldade que não parecem cristãos, matando crianças e velhos que não conseguiam caminhar, dando – os de comer a seus cachorros”. (MONTEIRO, 2005, p.73). Passaram – se séculos, essa guerra histórica e a selvageria continuam, agora com outros métodos de massacre e mais uma vez com a banalização da violência e o desprezo pela vida humana. As facas, usadas para a degola, a famosa “justiça de Mato Grosso”, apelido dado à arma de calibre 44, os fuzis e as metralhadoras estão sendo substituídos por métodos mais cruéis, que provocam agonia, intenso sofrimento físico e mental com chuvas de agrotóxicos, em função da pulverização por aviões e a contaminação das águas superficiais e subterrâneas.

Se voltarmos um pouquinho na história, vamos encontrar o então agropecuarista Eduardo Riedel, no ano de 2013, participando ativamente da organização do “Leilão da Resistência”; um evento realizado pelos setores do agronegócio com a finalidade de arrecadar verbas com as quais tais setores se propunham a financiar estratégias para proteger “suas terras” das invasões dos povos indígenas. Menos de uma década depois, em 2022, eis o então, Eduardo Riedel, já eleito governador de Mato Grosso do Sul se comprometendo a estabelecer uma política de paz e desenvolvimento para comunidade

indígena de MS, pois segundo ele, “os indígenas sul-mato-grossenses são parte fundamental da nossa identidade cultural e humana. Para além disso, é preciso desenvolver uma nova visão em relação a estas culturas, encarando-as como ativos do Estado. Cabe ao poder público criar políticas públicas que deem aos mais de 80 mil indígenas do Estado a capacidade de desenvolver suas culturas de forma autônoma e, ao mesmo tempo, oferecer a eles as condições básicas para isso”. https://diariomsnews.com.br/noticias/riedel-propoe-uma-politica-de-paz-e-desenvolvimento-para-comunidade-indigena-de-ms/)

Em sua peroração afirmou ainda: “Vamos trabalhar para viabilizar mais mecanismos de desenvolvimento econômico para estas comunidades, sempre respeitando suas bases culturais.” [...]. (https://diariomsnews.com.br/noticias/riedel-propoe-uma-politica-de-paz-e-desenvolvimento-para-comunidade-indigena-de-ms/)

Porém, o governador esqueceu rapidamente o compromisso assumido com os nativos e os fazendeiros vêm sendo denunciados pelas comunidades indígenas pelo uso de aviões para a pulverização de áreas de cultivo de commodities do agronegócio, obviamente, sem levar em conta que o território contíguo é povoado por povos indígenas e os agrotóxicos são lançados a poucos metros de escolas e roças de subsistência, atingindo propositalmente sua área de circulação, contaminando pessoas, pequenas lavouras de culturas de subsistência, animais e suas nascentes de água.

Um estudo, publicado na Associação Brasileira de Saúde Coletiva da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) avaliou a presença de agrotóxicos nas águas da retomada Guyraroká e encontrou mais de 20 substâncias que causam; sequelas graves à saúde, sendo 41% classificados como extrema e altamente tóxicos e 68% são proibidos na União Europeia; (Calleiros et al.,2024), mas pelo visto, aqui na terra do Agro tudo pode. Até o que é proibido no mundo, aqui eles nominam de civilizado.

“Nessa pesquisa, foram coletadas amostras de águas superficiais (rios), subterrâneas (abastecimento de poços artesianos) e alimentos, ao longo de dois anos agrícolas e em diferentes períodos de produção da soja. Todas as amostras, incluindo as coletadas durante período de vazio sanitário, registraram presença de resíduos de vinte diferentes Ingredientes Ativos (IA) de agrotóxicos. Dessas, 90% continha misturas de agrotóxicos, variando de dois a até 12 diferentes tipos de Ingredientes Ativos em uma única amostra coletada (conforme Dossiê Agrotóxico e Saúde Reprodutiva”, FIOCRUZ, RJ-2025).

O descaso e a irresponsabilidade são tamanhos que até água é negada. Direito humano fundamental para vida com dignidade, reconhecido pela ONU na Assembleia Geral de 28 de julho de 2010. O Senado Federal aprovou por unanimidade a PEC 6/2021 propõe a inclusão do acesso à água potável entre os direitos e garantias fundamentais previstos no artigo 5º da Constituição Federal, mas está parada na Câmara dos Deputados.

Os mais recentes episódios de odiosidades ocorreram nos meses de setembro e outubro do corrente ano com a pulverização e intoxicação por agrotóxicos sobre áreas habitadas por indígenas na Fazenda Ipuitã, em Caarapó, e também na região de Panambi-Lagoa Rica, em Douradina. A Portaria do Ministério da Justiça nº 3.219/2009 declarou a Terra

Indígena Guyraroká, de ocupação tradicional indígena do povo Guarani-Kaiowá, com área de 11.401 hectares.

A Funai já reconheceu Guyraroká, como área de ocupação tradicional do povo Guarani – Kaiowa, não demarcada definitivamente aguardando a conclusão do processo de homologação, hoje no STF. Processo esse “que fica emperrado na máquina burocrática do Estado, alimentada pelo lobby ruralista e pelo silêncio cúmplice das autoridades”.

Enquanto se aguarda, além da contaminação por agrotóxicos, estão impossibilitados de produzirem seus alimentos, de acesso a água potável ou em condições de consumo e trato de seus animais, sofrem violências físicas e mental por parte de “proprietários rurais ou seus jagunços”. Segundo o CIMI – Conselho Indigenista Missionário, em 25/10/2025 sequestraram uma adolescente da comunidade, diante dessa situação, e com o descaso do governo estadual, os nativos organizaram a busca e o resgate dessa jovem de 17 anos. Cerca de cinquenta deles deslocaram a sede da Fazenda Ipuitã, no mesmo dia e resgataram a jovem sob suspeita de abuso sexual e outras violências. https://cimi.org.br/2025/10/sequestro-e-suspeita-de-abuso-sexual-relatorio-ti-guyraroka/

Ao tomar conhecimento do protesto dos nativos e a tomada da citada propriedade, Eduardo Ridel manifestou - se nas redes, determinando uma rigorosa investigação e punição dos responsáveis pelo episódio: “As forças de segurança do Estado já estão agindo para responsabilizar estas organizações de aliciamento, manipulação e exploração da boa-fé de um reduzido número de indígenas”. Porém, permaneceu mudo, como de costume, a respeito da pulverização por aviões no local e suas consequências e também sobre a questão da jovem sequestrada, (que acabou sendo resgatada na sede da fazenda). Compreensível, pois como sindicalista que é, tem que ficar ao lado dos seus. Perguntado sobre a motivação da invasão e do sequestro de uma adolescente indígena, “o governador foi incisivo, não há provas”. https://www.campograndenews.com.br/politica/governador-e-ministra- defendem-investigacao-rigorosa-sobre-conflito-em-caarapo

Segundo relato dos fazendeiros, o grupo de indígenas atearam fogo na sede da propriedade e em maquinários agrícolas. Acusação negada pelo CIMI. Diante da situação qual foi o posicionamento do nosso atual governador

Junto do seu Secretário de Segurança Pública, e usando de costumeira criatividade”, nomearam como culpados da tragédia; os índios paraguaios; a serviço do tráfico de drogas; certamente, podemos prever que logo estarão sendo também responsabilizados pelo sequestro da jovem, invasão a propriedade e, por último, por pilotarem os aviões agrícolas que pulverizaram agrotóxicos na comunidade. Este governo vive um apagão, cegueira coletiva ou deficiência cognitiva!

Os paraguaios, ao longo da História, sempre foram “bodes expiatórios “das autoridades estaduais, bem como dos proprietários rurais e dos memorialistas: segundo eles, os índios que habitam a região meridional de Mato Grosso do Sul são “paraguaios” – argumento muitas vezes utilizado para a promoção de massacres. Essa camada social

oriunda das famílias oligárquicas tem sido célere em apresentar narrativas que negam os conflitos, a exploração do trabalho, os assassinatos e o colonialismo por povoamento. Essa narrativa negacionista tem sempre a finalidade de expropriação das terras indígenas. O propósito foi sempre e Intencionalmente de desviar a atenção da sociedade para o real problema que enfrentamos. Defendem, com naturalidade e extrema superficialidade, a ideia de que os nativos em solo sul-mato-grossense não são os verdadeiros povos originais.

Em meio à crise com os povos indígenas, eis que Riedel, no dia 30/10 vai ao RJ para, junto com alguns outros governadores de igual quilate, prestar solidariedade ao governador Castro pela realização de megaoperação policial nos complexos do Alemão e da Penha que resultou na morte de 121 pessoas! Disse ele, todo orgulhoso e faceiro: “Fui lá, sim, dar meu abraço de solidariedade a uma ação difícil. Sem olhar para o que acontece no Estado que governa, afirmou ainda: É triste de ver; lamento que o país tenha chegado a esse ponto, mas é necessário retomar a presença do Estado em qualquer palco do território brasileiro”.

E mais ainda disse: “Precisamos discutir, urgentemente, os problemas reais do Brasil e encontrar soluções que garantam paz ao povo brasileiro;

https://g1.globo.com/ms/mato-grosso-do-sul/noticia/2025/10/29/governador-de- ms-confirma-ida-ao-rio-de-janeiro-para-prestar-apoio-as-forcas-de- seguranca.ghtml

Aproveite, senhor governador, para levar o modelo de segurança pública de Mato Grosso do Sul! Aliás, que tal, começar a discussão por Mato Grosso do Sul? Sabemos que V.Exa. tem se ocupado em muitas viagens pelo Brasil pelo mundo afora e, certamente, não tem podido dar atenção aos crimes que ocorrem por aqui. Mas se nos der oportunidade de discutir, tal como propôs, poderemos lhe contar dos FEMINICIDIOS, ESTUPROS DE CRIANÇAS, ADOLESCENTES, de SEQUESTROS... Tem de tudo, senhor governador! Basta ter olhos para ver ouvidos para ouvir.

Por fim, o governador Eduardo Riedel, para encerrar o mês de outubro com “chave de ouro” (para ele e seus pares), participou da posse da nova Diretoria da Nelore-MS (Associação Sul-Mato-Grossense dos Criadores de Nelore), e na ocasião ressaltou que o apoio do governo aos pecuaristas vai além de incentivos financeiros. “Dentro do setor, atuamos de duas formas: incentivando com recursos e, acima de tudo, com presença constante. O Estado entende que este segmento é vital para nossa economia e contribui para a exportação e a produção em alto

Governador: olhe menos para os bois! MS, seu Estado, nosso Estado, tem homens, mulheres e crianças nas comunidades, nas ruas, nas favelas, sem sequer água potável para beber!


*** Professor titular aposentado da Universidade Federal de MS

 
 
 

1 comentário

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Paulo Portuga
há 14 horas
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Excelente texto, muito informativo sobre a situação de nossos irmãos e a posição do Estado opressor. Para a esquerda aprender a não ajudar a eleger certos políticos com pele de cordeiro...

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