O artigo no Blog do Alex Fraga intitulado "Arte e identidade sul-mato-grossense na obra de Cello Lima", é do prof. Dr. Fábio Germano - Gestor do Núcleo de Arte e Cultura da SED/MS
Mal nos damos conta e já estamos no mês de outubro, um mês pra lá de especial, pois, temos um tão esperado feriado prolongado, também chamado pelos nossos estudantes de: “semana do saco cheio”. Esse período se dá em função da celebração de datas importantes no calendário nacional e estadual, onde são comemorados dentre outros, o dia da padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida, o dia das crianças, e o dia da famosa divisão do estado de Mato Grosso, surgindo assim o estado do Mato Grosso do Sul.
Muito se fez até a divisão do estado, foram anos de histórias, fatos, acontecimentos políticos, econômicos, sociais e cultural, compondo o cenário desse estado tão rico e variado. Dessa história, muito já se foi explorado tanto para o meio acadêmico, como as demais áreas de interesse e registro histórico em geral. Mato Grosso do Sul compõe um universo originalmente diverso, multicultural e intercultural, pois aqui as diferentes culturas se interagem em contribuem para a formação da identidade cultural marcada genuinamente pela convivência e a interação das diferenças.
Nesse contexto tão diverso, o estado ainda passa pela velha mania que muitos, mal informados, insistem em confundir MS com MT. Disso já estamos acostumados a dar o tão insistente grito complementando: Mato Grosso DO SUL! Para que se firme nossa identidade como tal, nem que seja no grito.
E por falar em identidade, pode-se dizer que as culturas artísticas assim como as demais fazem parte de um conjunto de fazeres e pensares que expressam e traduzem muito sobre modos de ser e pensar. A arte e a educação exercem um papel preponderante na formação do ser humano pleno, e, sobretudo na tradução dos valores simbólicos culturais na representação de uma civilização. Mais que isso, e através da arte, pode-se identificar elementos representativos indenitários que traduzem costumes, tradições, religiosidades, fatos históricos, sociais, etc.
Felizmente Mato Grosso do Sul tem uma rica e variada manifestação artística que vão desde a cultura popular tradicional, passando pela erudita e regional. Essas manifestações são provenientes da necessidade que o homem tem de explorar seu rico universo criativo, através das múltiplas linguagens artísticas. Teatro, dança, música, artesanato, artes plásticas e tantas outras que trazem em suas expressões traços e marcas da cultura Sul-mato-grossense. Só para ser ter uma breve noção, essas expressões, geralmente vêm carregadas de elementos simbólicos, onde se exploram a exuberante natureza que o estado oferece, bem como a temática indígena, e dentre outras, as influências de países vizinhos como o Paraguai e Bolívia.
A busca e também e a formação da identidade sul-mato-grossense perpassa por todas essas questões e tantas outras de tamanha importância. Ao tocar nesse assunto, vale a pena referir-se ao artista plástico douradense Cello Lima que no conjunto da sua obra, sempre empregou símbolos e elementos característicos da nossa cultura. Cello é um artista que esbanja alegria no colorido das suas telas de grandes dimensões, onde além da temática bem empregada e representada, faz questão de trabalhar em cima de uma pesquisa consistente em pigmentos minerais, e como diria o artista plástico Humberto Espíndola: “Cello é uma das autoridades em pigmentos minerais de MS, poucos dominam isso tão bem! ”. E de fato é! Em sua obra é possível notar múltiplas tonalidades de terras e outros minerais que são colhidos em diversas regiões do estado, e criteriosamente trabalhados para a composição das obras.
A temática expressada por Cello quase sempre nos remete a uma reflexão politizada, através do emprego de frases bordadas diretamente na tela e o conjunto de motivos indígenas que decoram e enchem os olhos do expectador conduzindo o olhar para uma leitura contemplativa e crítica. Lima, sempre foi exigente e criterioso com a sua produção, o artista tem uma longa história de vida dedicada às artes, e traduz muito bem o universo cultural de Mato Grosso do Sul.
Na obra que aqui apresentamos, e que ironicamente Cello ainda não a intitulou, o artista tratou exclusivamente sobre a identidade sul-mato-grossense, identidade essa, que ainda está em formação, pois a nossa riqueza cultural está em constante mutação, mas carrega em si elementos que são a tradição e tradução da nossa gente.
Em 2018 ele foi convidado a fazer parte de um projeto cultural e educativo promovido pelo Núcleo de Arte e Cultura da Secretaria de Estado de Educação de MS, chamado: “Ateliê aberto”, onde se montou no saguão do Centro de Convenções Arquiteto Rubens Gil de Camillo em Campo Grande, parte do seu ateliê, para que os alunos e público em geral pudessem apreciar alguns momentos de criação do artista, resultando na pintura ao vivo, da obra de arte em questão, e ao mesmo tempo transformou-se em uma grande aula com a exposição de suas técnicas e habilidades criativas. Nessa ocasião aconteceram dois outros eventos importantes: A 12ª Mostra Cultural das Escolas Estaduais de MS e Festival MS in concert, ambos reuniram escolas de todo o estado com apresentações culturais que tratavam da temática da identidade sul-mato-grossense, ao qual Cello, foi uma das grandes atrações.
O artista fez questão de participar e pintar essa obra de arte que traduz a formação da identidade sul-mato-grossense através de uma pintura onde constam elementos representativos das culturas, marcados por dois símbolos circulares com motivos indígenas representando os estados de MT e respectivamente ligado pelo novo estado de MS. Essa simbologia segue no tratamento do plano onde uma rosa dos ventos dá o tom das direções permeadas pela simbologia da construção, expressadas com marcas de tijolos de barro, e o emprego de círculos coloridos que fazem referência a multiplicidade de povos e que são ladeados por iconografias da cerâmica primitiva paraguaia e boliviana, países que fazem fronteira com MS, e que também contribuíram para a nossa formação cultural.
A obra faz um passeio pela gênese dessa formação, através da representação de diferentes culturas em cores diferentes e a pigmentação mineral que contem inclusive terra trazida de Portugal, para a produção de pigmentos.
A tela é uma, entre muitas outras obras a tratar desse tema. Artistas como Humberto Espíndola marcou significativamente a história das artes plásticas, e da nossa divisão, na icônica série bovinocultura. Muitos outros artistas exploraram isso em distintas manifestações. Atualmente Cello Lima nos chama a atenção para as questões de identidade. Quem somos? De onde viemos e para onde vamos? Qual seria a nossa verdadeira identidade sul-mato-grossense?
Basta olharmos para nós mesmos, e vermos que quão múltipla é a nossa cultura e que o quanto temos de riquezas em MS. Esse conjunto de variantes são por vezes esquecidos ignorados por alguns..., porém, cá estão os nossos artistas para nos brindarem com obras de tamanha importância no entendimento de quem realmente somos nesse universo de distintas nações. Diante disso, fica sempre muitos questionamentos que assim como a obra de Cello Lima nos causa provocações e nos leva a reflexões acerca da nossa existência e permanecia nesse mundo tão diverso, e muitas das vezes tão injusto com os seus. E termino com essa reflexão bordada nessa obra onde se diz: “Não há passageiros na espaço-nave terra........... todos somos tripulação”.
Parabéns
Mato Grosso DO SUL! Parabéns
Cello Lima e todos os nossos artistas.
Fotos e texto: Fábio Germano
Técnica: Pintura em tela com pigmentos minerais, frotagem, texturas e bordado
Artista: Cello Lima
Dimensões: 1,50 x 1,20 cm Ano: 2018
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